Sonhos envelhecidos

Eu sou a mesma andorinha
que repousou em teu ninho,
dormiu em teus carinhos
e enfim, descobriu o teu jeito.
Julguei o momento perfeito,
sina de voejar noutros verões,
repousar por esses galpões
afim de encontrar meu leito.

Não indagues, minhas asas,
não tive muita escolha!
Os versos no branco da folha,
desejo febril daquela partida...
dura, penosa, triste despedida;
busca incansável do verão,
do sol, dos ventos, da noção
e das distâncias dessa vida...

Teus olhos acesos e espertos,
sedentos pelo calor das asas,
ficaram no vazio das brasas,
sem granjear o corpo meu...
A promissão de um apogeu,
tantos sóis pela primavera,
reinventar nossas quimeras...
semente que jamais cresceu!

Nessa imensa ida migratória,
criei filhotes, renasci pra vida!
Perene recordo essa partida,
repetidamente em teu ninho.
Cá estou a provar espinhos,
gaiola que prende meu canto
e envolvida neste encanto
me distraio dos caminhos.

Fantasmas embaçam o olhar,
numa tarde de céu nublado,
asas presas, frágeis - bico calado.
Distancio-me dos caprichos,
por alma adentro viro bicho
garras envoltas e tão afiadas!
Sede e saudades afogadas
em ressábios pelos bolichos.

Bebo a ternura de teus olhos,
encontro denso de retinas,
alma que encanta e alucina.
Remanso que vira tempestade!
Não há sonhos pela eternidade,
teu ninho já não é de amor,
a lua não mais sente o clamor,
nem vê sorrisos de felicidade...

Teu cativeiro ensinou a voar!
Devaneios sem perder valores,
desejo no aroma das flores
e teu rosto se perde no tempo.
Agora, não há mais alento
nesse sorriso que distancia,
destino covarde – te renuncia,
esqueço-te por um momento.

Andorinha nas mãos do poeta,
aconchego dos meus verões,
vivo dias a inspirar canções...
alma doce de enfeitar as eras
abrigo nas serenas primaveras...
se a vida, enfim te reencontrar
é neste ninho que vais ficar:
envelhecido pelas esperas!